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AFONSO CELSO AINDA SE UFANARIA DO NOSSO PAÍS?


Você, estimado (a) leitor (a), se jactaria, hoje, das grandezas do nosso País - mormente das grandezas morais dos mandarins da nossa República - conforme se ufanava o conde e escritor Afonso Celso ao escrever a obra <Porque Me Ufano do Meu País>? Leia o que vai abaixo e tire suas conclusões.

PORQUE ME UFANO!
Editado em 1900, Porque Me Ufano do Meu País, do conde  Afonso Celso, foi traduzido em doze línguas, vendeu zilhões e criou o sentimento do ufanismo. Quer dizer, antecipou o dito de Nelson Rodrigues: "Toda unanimidade é burra". É só ver show com 1 milhão de assistentes, Jornal Nacional destinado a 30 milhões de espectadores, discurso de candidato político visando a 50 milhões de eleitores.
Nos anos 60 escrevi peça usando o título Porque Me Ufano do Meu País, gozação evidente. A Censura proibiu, por não perceber a gozação. Ou por perceber, sei lá.
 

O livro é mais fantástico até do que o Brejal dos Guajas, do Sarney. Tem epígrafe em inglês: "Right or wrong, my country". O conde é supernacionalista, mas não resiste ao gringo. Que não traduz. E não diz, ou não sabe, quem é. Eu sei.
O gringo é Stephen Decatur, herói leatherneck, fuzileiro naval americano. Traduzo: "Certa ou errada, minha pátria". G.K. Chesterton comentava: "É o mesmo que dizer – 'Minha mãe, sóbria ou bêbada'".
Reproduzo aqui trechos do livro, com o nobre intuito de iluminar vosso ufanismo: 
• Quando disserdes "Somos brasileiros!", levantai a cabeça, transbordantes de nobre ufania. Deveis agradecer todo dia a Deus o haver Ele vos outorgado por berço o Brasil.
• A flora brasileira é maravilhosamente rica, dado aí se juntarem todas as flores e frutas do universo.
• Negros, brancos, peles-vermelhas, mestiços, vivem aqui em abundância e paz.
• As matas brasileiras são tão compactas que se lhes poderia caminhar por cima.
• Notabiliza-se ainda a floresta brasileira pela ausência relativa de animais ferozes.
• Os pampas do sul, pátria do tufão, são atravessados por armentos de poldros indômitos, têm jardins incomparáveis, flora opulenta, fauna inestimável – aves que não emigram, de bem que se acham onde nasceram.
• Abundam em várias regiões do país minas de ouro e jazidas de diamantes. Algumas regiões chamam-se, com propriedade, Ouro-Branco, Ouro-Preto, Ouro-Fino, Diamantina.
• Em certas regiões até a poeira dos caminhos é aurífera.
• Em alguns pés, em Mato Grosso, as laranjas, já muito doces, quando murcham nos galhos reamadurecem dulcíssimas. Verdadeira ressurreição.
• Ao lavrador é fácil retirar da terra tudo quanto precise, exceto sal, de que, aliás, se encontram no Brasil grandes jazidas.
• Quase todas as culturas dão duas colheitas anuais.
• Em seu subsolo, solo, ares, selvas, águas, está tudo. Poderia, se quisesse, erguer em torno de suas fronteiras a Muralha da China.
• Ninguém, querendo trabalhar, morrerá de fome. Parece país de milionários, tão largamente se gasta.
• Feridas e amputações cicatrizam mais depressa do que nos hospitais do Velho Mundo.
• As florestas têm poucos animais ferozes. Os que existem limitam-se a defender-se, fazendo escassas vítimas.
• No Amazonas se conhecem albinos que entretêm grande familiaridade com animais. As onças aí são inofensivas. Serpentes gigantescas guardam as cabanas.
• Entre nós há tolerância e ausência de preconceitos de raça, religião, ou posição, decaindo mesmo em promiscuidade.
• O Brasileiro, em última análise, passa os dias mais felizes do que o alemão, o francês, o inglês, dias mais serenos, mais risonhos, mais esperançosos.
• Quase todos os homens políticos brasileiros legam à miséria as suas famílias. Qual o que já se locupletassem à custa do benefício público?

Da Revista Veja, Edição 1945 .  de março de 2006

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"Sétimo motivo da superioridade do Brasil: nobres predicados do caráter nacional

O brasileiro fisicamente não é um degenerado. Notam-se muitos de estatura elevada, vigor e agilidade pouco vulgares. Quanto ao seu caráter, ainda os piores detratores não lhe podem negar:
— 1.° Sentimento de independência, levado até à indisciplina.
— 2.° Hospitalidade. No interior, raro se encontram hospedarias. Quem chega é acolhido, com afabilidade e lhaneza, na primeira casa a que bata. Os lares de certa ordem têm um quarto especial sempre pronto, chamado o quarto dos hóspedes. Estes demoram-se meses e anos às vezes. O dono da casa não se incomoda. É para ele sinal de importância, como o receber cartas numerosas no correio.
— 3.° Afeição à ordem, à paz, ao melhoramento.
— 4.° Paciência e resignação.
— 5.° Doçura, longanimidade, desinteresse.
— 6.° Escrúpulo no cumprimento das obrigações contraídas. Julgar-se-ia desairado quem, no interior, alegasse prescrição de dívida.
— 7.° Espírito extremo de caridade. Elisée Reclus observa que nenhures se acha como no Brasil tão notável organização de estabelecimentos de solidariedade, mantidos por esmolas, sem intervenção do Governo. Produz resultado o menor apelo, em nome dos que sofrem.
— 8.° Acessibilidade que degenera, às vezes, em imitação do estrangeiro.
— 9.° Tolerância; ausência de preconceitos de raça, religião, cor, posição, decaindo mesmo em promiscuidade. Só há exemplo de um jornalista estrangeiro expulso. Durante a guerra do Paraguai, um francês públicava no Rio de Janeiro um jornal simpático ao inimigo, caricaturando os nossos generais.
— 10.° Honradez no desempenho de funções públicas ou particulares.
A estatística dos crimes depõe muito em favor dos nossos costumes. Viaja-se pelo sertão, sem armas, com plena segurança, topando sempre gente simples, honesta, serviçal.
Os homens de Estado costumam deixar o poder mais pobres do que nele entram. Magistrados subalternos, insuficientemente remunerados, sustentam terríveis lutas obscuras, em prol da justiça, contra potentados locais. Casos de venalidade enumeram-se raríssimos, geralmente profligados. A República apoderou-se de surpresa dos arquivos do Império: nada encontrou, que o pudesse desabonar. Por ocasião dessa revolução, senadores ficaram tão pobres que o novo regime lhes ofereceu pensões. Ao Imperador que governara 50 anos, assegurou a Constituição Republicana meios de subsistência de que ele precisava, mas que não aceitou. Quase todos os homens políticos brasileiros legam a miséria às suas famílias. Qual o que já se locupletasse à custa do beneficio público?
Argúem ao caráter brasileiro fraqueza de sentimento patriótico. É uma inverdade. Não costumamos alardear patriotismo, mas temo-lo, capaz de altos feitos, como quem mais o tenha, nunca sofremos calados imposições de quem quer que seja. A luta contra os holandeses, a da independência, a do Paraguai, a questão do rochedo estéril da Trindade que a Inglaterra foi obrigada a nos restituir, tantos outros fatos significativos demonstram que a idéia da Pátria congrega e inflama os nossos corações. A bandeira do Brasil sabe fazer-se respeitar.
Acusam ainda o caráter brasileiro de baldo de iniciativa, decisão e firmeza.
São antes desvirtudes do que vícios inveterados. A educação os corrigirá.
Já desapareceu a principal causa de algumas tendências más do nosso meio; a escravidão. “O povo brasileiro é demasiado indolente para ser mau” — escreveu alguém. Sem dúvida a nossa terra ubérrima, as facilidades da vida dispensam entre nós grande diligência e esforço. Mas hão de vir forçosamente, à proporção que a concorrência e o conflito pela existência se acirrarem. A nossa proverbial indolência não nos impediu nem nos impede de termos progredido e de progredirmos. Somos, a despeito de tudo, tão adiantados como os países de condições análogas às nossas, ou mesmo mais do que eles; ocupamos o terceiro lugar entre os da raça latina, só contando acima de nós a França e a Itália.
Dos brasileiros disse Victor Hugo: “Sois homens de sentimentos elevados; sois uma generosa nação. Tendes a dupla vantagem de uma terra virgem e de uma raça antiga. Um grande passado histórico vos liga ao continente civilizador. Reunis a lua da Europa ao sol da América.”
Afirmou um filósofo que homem perfeito é aquele em quem as qualidades levam pequena vantagem aos defeitos. No caráter brasileiro, há saldo considerável a favor das qualidades. Nenhuma falha lhe é peculiar ou exclusiva. Tem preciosas virtudes, eminentemente sociais. Não se mostra refratário a ensinamentos, nem insusceptível de emendas. Revela disposições ótimas, fundo excelente. Cultivem-no. Tudo autoriza afirmar resultados tão prodigiosos como o das sementes plantadas no nosso solo, convenientemente lavrado."

Fonte Digital
Digitalização de edição em papel
Laemert & C. Livreiros - Editores, 1908.

© 2002 — Afonso Celso

Extraído da página http://www.ebooksbrasil.org

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