UMAS E OUTRAS DO HELIO FERNANDES - 21-4-14


HELIO FERNANDES -
O Exército sempre mandou no Brasil, aética e imoralmente, mas não perseguiu, torturou, violentou e assassinou cidadãos com a intolerância e arrogância desses 21 anos. E não mandaram apenas na República. 
Caxias chegou a general com 18 anos, marechal aos 25, Duque aos 28 anos. É o único duque de toda a história do Império. Comandou as tropas brasileiras na estranha e deprimente Guerra do Paraguai. Veio embora em 1868, dizendo, “a guerra acabou”. Só acabaria em 1870. 
Três países, Brasil, Argentina, Uruguai, devastando e destruindo o Paraguai por ordens da Inglaterra, que então dominava o mundo, política, territorial e militarmente. 
Em 15 de novembro, Deodoro e Floriano traíram o Imperador e a República 
Os “Propagandistas da República” e os “Abolicionistas”, (que geração esplêndida de brasileiros) vinham há anos lutando pelo fim da escravidão, que já acabara em muitos países. E pela República. Foram derrotados e ultrapassados por esses dois marechais, que como coronéis, vieram brigados do Paraguai.
Na madrugada de 15 de novembro de 1889, se reconciliaram, derrubaram o Imperador de quem se diziam grandes admiradores, traíram os civis que lutavam sem esmorecimento pelo progresso, libertação e a tão ansiada República. Deodoro e Floriano tomaram o Poder, indiretamente, ficaram até 25 de fevereiro, quando foi “promulgada” a primeira Constituição da República.
Mas era uma Constituição falsa, tudo continuou igual. Deodoro, que era presidente indireto, foi confirmado como presidente novamente indireto. Floriano, vice indireto, também garantido indiretamente. E Deodoro foi forçado a nomear o próprio Floriano Ministro da Guerra. 
Deodoro dá outro “golpe”, mas logo é derrubado por Floriano 
Em 8 de novembro do mesmo 1891, Deodoro cansou de ser o segundo de Floriano, decidiu se libertar. Fechou o Congresso, demitiu Floriano, mas não tinha força para se manter. 15 dias depois foi afastado do cargo, quem tinha a força era ele, Ministro da Guerra. 
Floriano assume inconstitucionalmente 
A Constituição de 1891 determinava: “Se o cargo de presidente ficasse vago na primeira metade o vice assumiria, convocaria eleição DIRETA, em 30 dias”. Floriano assumiu e ficou até o fim, se julgava Imperador.
Mas em 1894 veio Prudente de Moraes, o primeiro civil, embora os militares mandassem de verdade. Não assassinando, mas gozando dos privilégios e mordomias, que se repetiriam mais ainda, com a criação de Brasília. 
Sem violência, militares se satisfizeram com mordomias e grandes privilégios 
Os 41 anos da chamada “República Velha”, ganharam essa denominação pejorativa por causa de alguns civis mas também por muitos militares. Estes inventaram a ocupação de dois cargos ao mesmo tempo, um militar e outro civil. Acumulavam dois cargos, recebiam os dois salários, mas só ocupavam um.
Os “heróicos” e “bravos” tenentes de 1922, 24 e 26, tomaram o poder de verdade em 1930. E logo fizeram o maior festival de imoralidade e falta de ética. Ressuscitando as “capitanias hereditárias”. Então, cada um assaltou (a palavra é essa), um estado, se transformaram em governadores, secretários, Ministros, depois senadores. 
Todos “continuaram” oficiais acumulando com cargos civis 
Vou citar alguns casos, seriam centenas. Em 1932, o Segundo Tenente, Ernesto Geisel saiu da Academia com 21 anos, foi mandado servir na Paraíba. O governador, Gratuliano de Brito, logo nomeou-o Secretário da Fazenda. Recebendo os dois salários, sem ir ao quartel, mas com todos os “direitos” às promoções.
Em 1934 Geisel foi promovido a Primeiro Tenente, quando um oficial é promovido, logo é “remanejado”, linguagem da tropa. Foi para o Rio Grande do Norte, praticamente bastava atravessar a rua. Novamente: Secretário de Finanças mudava de nome, de estado para estado.
Como major, foi Superintendente da Refinaria de Cubatão. Chegou a quatro Estrelas sem conhecer nenhum quartel. E ainda foi para o STM, fugindo de Costa e Silva “presidente”. 
Isso se repetiu indefinidamente 
Tomavam um estado, não precisava ser o seu. O Tenente Juracy Magalhães nasceu no Ceará mas achava a Bahia mais favorável, mudou-se . Fez carreira impressionante, foi governador, senador, embaixador. E longevo como alguns outros, foi servo, submisso e subserviente ao golpe de 64, no qual mandou de verdade. 
Juracy “reserva” de Costa e Silva 
Castelo, Golbery, os dois Geisel, mais alguns outros, tinham pânico do primeiro golpista vir a ocupar a “presidência”, como aconteceu. Castelo foi Marechal, Ernesto Geisel para o STM. Quando Costa e Silva ficou “incapacitado”, voltou imediatamente para a ativa. (Foi o primeiro caso como esse na História do Brasil. E acabou “presidente”).
Como todos tinham medo de Costa e Silva, Castelo “preparou” dois possíveis ou supostos concorrentes a ele. Mandou Juracy como embaixador nos EUA, (a matriz do golpe) e Bilac Pinto embaixador na França. Não deram nem para a saída. Costa e Silva resolveu viajar à Europa. Disseram: “Se viajar será demitido”. No aeroporto decidiu fazer graça e tripudiar: “Embarco Ministro e volto Ministro”. Foi o que aconteceu. 
Golbery acumulava, presidindo a Dow Chemical 
Tenente Coronel, tinha um cargo de alto salário e fartas mordomias, a empresa maior assassina do mundo. Poderosa fabricante de napalm, é responsável pelo assassinato de milhões de pessoas, principalmente no Vietnã e na Coréia.
Em determinado momento, a Dow Chemical resolveu que para seus interesses era melhor Golbery ficar perto de Brasília mas não na capital. Compraram fazenda maravilhosa em Goiás, Golbery passou para a reserva.
Aí se beneficiou de outra IMORALIDADE VERGONHOSA, que favoreceu a TODOS, MAS TODOS MESMO, oficiais do Exército, Marinha e Aeronáutica. Saindo da ativa, tinham direito (?) a duas promoções. Tenente-Coronel, Golbery foi promovido a coronel e a general, sem jamais ter conhecido um quartel. Servia sempre em gabinetes, na verdade foi golpista a vida toda, bem mais inteligente do que todos. 
Isso vinha de longe, bem antes do golpe 
Muito tempo atrás, nem se pensava em 1964, o governo fez intervenção, (merecidíssima) na Light. Mas por que o general Orlando Geisel teria que ser o interventor? Salário altíssimo e até inacreditável. Acumulando com o cargo e os proventos militares. 
Isso só foi “descoberto” pela constituinte de 1945 
A melhor constituinte da nossa História, que discutiu, aprovou e promulgou a Constituição de 1946, estarrecida, tomou conhecimento dessa espantosa duplicidade de cargos e de salários. Decidiu que tinha que acabar com a imoralidade. Se não fizessem nada seriam cúmplices. 
A pressão das forças armadas sobre a Constituição 
Foi uma avalanche em cima da Constituinte. Já com maioria absoluta para aprovar o fim dessas mordomias antiéticas e privilégios, tiveram que enfrentar a resistência fardada.
A única solução: fizeram um acordo, o fim dessas imoralidades foi aprovado, com uma ressalva: SÓ ENTRARIAM EM VIGOR DENTRO DE 8 ANOS.
Portanto só a partir de 1954 vigoraria o correto: o militar só poderia exercer um cargo e receber unicamente um salário. Mas todos já estavam no fim da carreira, generais, almirantes e brigadeiros. Os que viessem depois, que se “virassem”. 
A duplicidade continuou em muitos casos, imoralmente 
O mais famoso de todos, foi o Major Jarbas Passarinho. Transferido para o Pará como militar, acumulou com o cargo de Superintendente da Petrobras. No dia 1º de abril de 64, invadiu o palácio do governo, “se fez” governador. Teve que passar para a reserva, com as duas promoções do privilégio, se transformou em coronel.
Dois anos depois “se fez” senador, a seguir “se fez” Ministro da Educação. Com a “incapacidade” de Costa e Silva e com novo “presidente”, Passarinho não foi atingido, “se fez” Ministro do Trabalho. 
“Às favas com a consciência” 
Pouco antes, com a aprovação do mais selvagem decreto de repressão, a instauração do AI-5, Passarinho preparou uma frase para se fazer notado. É essa que está no título desta nota.
Só que então o Exército cansara apenas de privilégios e mordomias, queria o Poder total. E nesse remanejamento do já coronel Passarinho, estávamos em pleno regime autoritário, arbitrário, atrabiliário, dominado pela perseguição, a tortura e o assassinato. Coisas que não aconteciam no Império ou na Primeira República. 
Passarinho ainda vivo, e mentindo como sempre 
Continua dando entrevista, principalmente em televisões oficiais. E vai repetindo sempre, provocando gargalhadas em quem conhece a realidade: “Fui várias vezes convidado para ser presidente, não aceitei”. Como se o Exército fosse convidar para presidente, com aspas ou sem elas, um major que passara para a reserva como coronel. 
O Exército de hoje, todas as facilidades para pedir PERDÃO, DESCUPLAS, LAMENTAR assassinatos 
Os oficiais, principalmente generais, almirantes, brigadeiros, não participaram de coisa alguma desde 1964. Um segundo tenente que saísse da Academia no dia 1º de Abril de 1964, com 21 anos, (a idade mínima) estaria hoje com 71 anos. Há mais de 7 anos na reserva, a idade limite é 66 anos.
Milhares de outros oficiais foram passados para a reserva ditatorialmente, porque discordaram do golpe. Resistiram a ele, democraticamente, mas foram punidos ditatorialmente.
Portanto, os generais de hoje têm tudo para libertarem, pelo menos simbólica e verbalmente o Exército da ignomínia de um passado, que mancha e macula a farda. Que pode ser limpa com palavras e compreensão. 
Podem aproveitar a data de hoje 
Neste 21 de abril histórico embora apenas parcialmente merecedor de homenagens, os generais que não foram da ativa durante essa fase tenebrosa, podiam tomar a decisão reconciliadora. Que além de unir o Brasil, pode também livrá-los de situação incomoda de investigar e concluir “quem foi assassino e quem não foi”, durante esses 21 anos.
Inesquecíveis para o país, como tormento, para os militares que contaminaram as Forças Armadas, como assassinos confessos.
Como mostrei de forma irrefutável, e poderia continuar escrevendo horas e horas, gerações e gerações de militares se aproveitaram do país. Mas pelo menos não perseguiram, não torturaram, não assassinaram. 
PS – Perdão, desculpas, lamentos, não são humilhantes. É ou seria apenas o reconhecimento e a tentativa de reabilitação. E a ANISTIA insensata, continuaria servindo apenas os militares culpados. 
PS1 – Podem começar a pensar e efetivar a sugestão do repórter. O Papa pediu desculpas ao mundo, por causa dos padres pedófilos.
PS2 – Não queremos que peçam PERDÃO ao mundo, apenas ao povo brasileiro. E passem para a reserva convencidos de que merecem respeito.

Da Tribuna da Imprensa On Line de 21-4-14.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

NOTÍCIAS EM DESTAQUE - 1ª EDIÇÃO DE 10/12/2023 - DOMINGO

NOTÍCIAS EM DESTAQUE - 1ª EDIÇÃO DE 05/8/2023 - SÁBADO

NOTÍCIAS EM DESTAQUE - 2ª EDIÇÃO DE 08/4/2024 - SEGUNDA-FEIRA