UMAS E OUTRAS DO HELIO FERNANDES

Começou com compreensão, carinho, confiança. Os governantes fizeram o que os manifestantes esperavam: aumentaram todo o transporte. Protestaram, eram contra serviços vexaminosos, nada mudou, apoio, aplauso, nenhuma preocupação. Agora, assombro, perplexidade, medo visível, o que vai acontecer? Violência e mais violência. As Instituições funcionam. Como SATISFAZER a INSATISFAÇÃO?

Helio Fernandes
No início foram inteligentes. Aparentemente e declaradamente combatiam os péssimos serviços de transportes, ônibus, trens, metrôs. Do Rio e São Paulo, preventivamente contra a exploração, mas também repudiando o aumento geral que já se anunciava.
E como os governantes não governam nem raciocinam, não perceberam nada, aumentaram as tarifas, na certeza de que, como sempre, tudo seria assimilado.
Os manifestantes estavam nas ruas, timidamente, em número não elevado, mas já consistente. Acreditavam que o protesto atingira apenas ônibus, subsidiados pelos governos. Mas as críticas atingiram também trens e metrôs, nada funciona. Aí já eram multidões, cada vez maiores, os governadores e prefeitos “se surpreenderam”, a única palavra que conseguiam pronunciar.

Logicamente, somado com a idiotice dos que não sabem ver, ouvir ou compreender: “Não voltaremos atrás, o aumento dos preços é para valer”. Primeiro, Alckmin e Haddad. Logo seguidos na arrogância, incompetência e imprudência pelo Rio, Cabral e Eduardo Paes.
A selvageria da repressão incendiou os protestos. Que cresceram com a volta de Paris, e Alckmin, afrontosa e vergonhosamente justificando e defendendo abertamente a Polícia Militar. (Haddad mais contido, sem defender a violência, mas também sem um gesto para reprimi-la).
Aí não havia mais volta, os governantes do Rio e São Paulo, apavorados, mudaram de rumo e de rota, apressadamente decidiram cancelar os aumentos, já determinados em quase todas as capitais e cidades importantes. Só que nesse momento já não era o Passe Livre contra os meios de transportes, e sim um movimento de centenas de milhares, com objetivos bem delineados, decididos, declarados conscientemente.
Já não era mais reivindicação circunstancial, insatisfação ampla, geral e irrestrita. E o Rio e São Paulo só dominavam a repercussão por serem os mais populosos e importantes. Mas essa INSATISFAÇÃO, assim, bem grande, porque sem que os governantes, cientistas, analistas marqueteiros percebessem, a palavra devassou o país inteiro.
Aí, as televisões, que cobriram tudo, dia e noite, não havia mais “programação ou grande a cumprir”, deram aula de cobertura, de civismo de um lado e violência de outro, até mesmo de Geografia, Juazeiro do Norte, com seu prefeito encurralado e preso por 7 horas, ganhou projeção nacional, poucos sabiam onde ficava.
E logo surgiram outras quase 100 cidades, grandes, médias e pequenas, que passaram a protestar, a se manifestar, a mostrar que existiam.
SURGE O “PEQUENO GRUPO” DE
VÂNDALOS E BADERNEIROS, REPUDIADOS
MAS ATINGINDO OS MANIFESTANTES PACÍFICOS

Já passaram a existir os choques de desordem dentro de um movimento que se auto-intitulava de pacífico, e parecia mesmo. Mas os assaltos que começaram insensível e insensatamente na Assembleia Legislativa do Rio, foram se alastrando, aumentando, ganhando proporções nacionais e colossais. E se em algum momento os protestantes iniciais recriminaram esses “vândalos e baderneiros” (expressão deles mesmos), no correr dos dias a impressão é de que não havia mais a discordância entre eles e com eles.
Como tudo é muito confuso, fora de foco, espalhado e sem comando, pelo menos suposto, fica difícil analisar para localizar propósitos e objetivos acrescentados à perspectiva inicial. Os manifestantes do Passe Livre teriam perdido espaço no movimento? Essa perda de espaço seria conseqüência, constatação e concessão deliberada?
Continuamos analisando tudo que vemos ou sabemos, mas os fatos agora caminham ou despencam com tal velocidade que visíveis mesmo só o fogo, a depredação, a tentativa de destruir o que aparece pela frente. Ou não aparecem, são provocados.
E surge então a pergunta inquietante: esses VÂNDALOS e BADERNEIROS continuam em PEQUENO GRUPO? A partir de determinado instante, eles passaram a se constituir no GRUPO DOMINANTE dentro do que era PACÍFICO e encantava pela conscientização.
AS INSTITUIÇÕES NÃO AGUENTAM O
TRANCO, COMO ATENDER OS PROTESTOS

Concedidos ou conquistados os pedidos ou exigência da redução das tarifas em quase todo o país, os governantes foram surpreendidos pelas afirmações do grupo protestante: “A redução dos preços dos transportes era um ponto de partida, jamais foi o nosso objetivo ou o ponto de chegada”.
Já havia colocado essa questão antes, não me surpreendi, não me revoltei, não me arrependi do apoio que dei e continuo dando à INSATISFAÇÃO, palavra que uso desde que tudo começou, e acrescentei todos os dias, nos títulos e nos comentários: “O POVO ESTÁ NAS RUAS”.  Apesar de tudo, já com muitas dúvidas a respeito de quem quer e de quem não quer alguma coisa viável dentro do movimento.
OS PROTESTOS NÃO PODEM PARAR.
MAS SEM PERPLEXIDADE E MEDO

Os manifestantes dominaram as ruas até anteontem, quinta-feira, chegando até a madrugada de ontem, sexta. Mas agora houve mais violência do antigo “pequeno grupo” de baderneiros e desordeiros do que antes. As tentativas de assaltar a Alerj do Rio, quase brincadeira diante do vulto das tentativas contra a Prefeitura também no Rio, e principalmente os assaltos quase consumados em Brasília.
Foi assustador, não pelos propósitos de invasão, mas pelas forças poderosas, civis e militares, que “convidaram” a entrar no ringue. Quase todos concordaram que a luta é de 15 rounds, mas não podem desafiar para enfrentar, forças as mais poderosas. É preciso expurgar esses vândalos, da mesma forma como expulsaram políticos “veteranos, corruptos e sacanas”, que pretendiam fazer parte do POVO ESTÁ NAS RUAS.
Por que chamar para a luta os que estavam adormecidos, desinteressados, nem atentos nem observadores? O pessoal do Movimento Passe Livre não pode ir para casa. A noite da revolta e o dia da RENOVOLUÇÃO ainda não terminaram. Mas têm que lutar com convicção, objetivos claros, reivindicações não de longo prazo, pois tudo se perderá no tempo. Às ruas ou permaneçam nas ruas, mas sem provocar pânico como na quinta e quase sexta-feira.
A RENOVOLUÇÃO, QUE PREGO HÁ 
ANOS, E QUE CHAMEI ASSIM PARA QUE
NÃO PENSASSEM QUE ERA REVOLUÇÃO, QUE 
MUITOS LIGAM LOGO À GUERRA CIVIL

Obrigado a Luiz de Moraes Rego, que publicou ontem, integralmente, meu manifesto de anos e anos que denominei de RENOVOLUÇÃO, pelos motivos que expliquei. Com esse serviço que agradeço de coração, não preciso republicar o que escrevi e repeti tantas vezes. Basta acessá-lo e verificar que tudo o que é preciso fazer está nessa R-E-N-O-V-O-L-U-Ç-Ã-O.
Reforma política, eleitoral, partidária, mudanças no Congresso, na forma de eleição. Escrevendo há anos, está a palavra muito usada pelos jovens do Passe Livre inicial: “Representatividade”, que da forma como se “consegue”, não representa coisa alguma. O que dizem hoje os jovens que nem eram nascidos quando escrevi tudo isso. Mas tive sempre o cuidado de LUTAR POR RESULTADOS e não de chegar ao Poder pela violência. Leiam o que foi transcrito pelo Moraes Rego e se manifestem.
O PRESIDENCIALISMO COM
PLURIPARTIDARISMO, IMPOSSIBILIDADE
DE GOVERNABILIDADE
ESTÍMULO MAIOR À CORRUPÇÃO

Se os manifestantes pretendem ganhar a luta, têm que extirpar e expulsar a violência e concentrar as reivindicações em alvos que podem ser conquistados, tendo como exemplo maior o fim da CORRUPÇÃO. No início isso era citado, mudaram para outros objetivos.
Existem duas formas de combater a CORRUPÇÃO. A imediata, que é mais fácil, a do sistema de governo velho e envelhecido, que é o presidencialismo com pluripartidarismo.
É impossível governar com esse sistema político-partidário corrupto e corrompido. Todos os males surgem dessa anomalia e traição à democracia. Com 513 deputados e 81 senadores que não REPRESENTAM coisa alguma, mas dominam o Poder, não há GOVERNABILIDADE.
A cada votação, seja quem for o presidente e o partido que estiver no Poder, é indispensável NEGOCIAR. Traduzindo: é preciso entregar pedaços inteiros do patrimônio nacional aos 29 partidos e 39 ministros que compõem o sistema. Com destaque para o PMDB, que jamais quer ter candidato a presidente, prefere participar da divisão, sempre mais voraz do que os outros.
No meu manifesto da RENOVOLUÇÃO, todos os partidos são obrigados a terem, SEMPRE, candidato a presidente da República. Se os partidos se organizam, se estruturam e existem para cumprirem seus projetos e planos de administração, têm que chegar ao Poder. E como realizarão alguma coisa, sem candidatos a presidente?
PS – Apoiamos todas as reivindicações provocadas pela INSATISFAÇÃO legítima dos jovens que assistem o tempo passar sem que nada aconteça.
PS2 – Como INSATISFAÇÃO das mais positivas, as que ligam BILHÕES e BILHÕES com as obras “faraônicas” (desculpem) da Copa do mundo, que garantiam: “Todos os estádios serão construídos com recursos privados”. Tudo foi feito com dinheiro público.
PS3 – Em suma, a luta continua, é imperioso que se mantenha. Mas sem a violência de quinta e de quinta para sexta. E com objetivos que possam ser obtidos a curto prazo, para que então se prepare a modificação do sistema de governo e logicamente da falsa REPRESENTATIVIDADE.
PS4 – Podemos adotar o PARLAMENTARISMO, pelo qual grandes brasileiros lutaram e quase conseguiram na Constituinte de 88.
PS5 – Ou então o PRESIDENCIALISMO com BIPARTIDARISMO, como nos EUA, que há 224 anos começaram e até hoje só têm dois partidos. Isso não é passaporte para a eficiência, mas pelo menos impede que os aproveitadores consigam transpor, tranquilamente, a alfândega da irresponsabilidade e da corrupção.
PS6 – Para terminar por hoje: é indispensável que os jovens que começaram o Movimento Passe Livre apareçam, mostrem a cara, possam se transformar em referência ou alternativa.
PS7 – Não quero de jeito algum que abandonem as trincheiras, bem ao contrário, Mas alguém precisa de REPRESENTATIVIDADE, conquistada nas ruas.
PS8 – As ruas não estão órfãs, mas correm o risco de se confundirem com os aqueles aos quais combatem, deixarem que eles se levantem da lona.
PS9 – É preciso espírito e disposição de Cassius Clay, que lutou contra um governo para não ir combater numa guerra (o Vietnã) que não era dele. Perdeu o título de campeão do mundo, que lhe roubaram, mas ganhou o respeito do mundo. Com o nome de Muhammad Ali.
PS10 – O Movimento Passe Livre anunciou ontem à tarde que as manifestações em São Paulo estão suspensas. Não informou por que São Paulo, onde a violência da repressão diminuiu muito.
PS11 – Por que não em Brasília? Lá os encontros entre manifestantes e policiais atingiram o clima de histeria e confronto aberto. Não houve informação mais detalhada.

Da Tribuna da Imprensa de 22-6-2013.

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