UMAS E OUTRAS DO HÉLIO FERNANDES - 11-5-2013
Helio Fernandes
A renúncia do aventureiro Jânio Quadros, para voltar nos braços do povo e no colo do alto comando militar, não deu certo por dois motivos principais:
1 – Brasília “ainda ia ser”, nada estava funcionando. Os generais não conseguiam se comunicar, se já tivesse chegado a era e a época do celular, tudo seria diferente.
2 – A Liga da Legalidade, criada e comandada por Leonel Brizola, que encurralou os militares. Aceitaram então a posse de Jango e o Parlamentarismo com Tancredo. Jango concordou logo, Brizola foi muito mais sensato, argumentou: “Já ganhamos, chegaremos ao Poder sem compromisso ou concessão”.
Jango era diferente de Brizola. Em 1953, ministro do Trabalho, o famoso Manifesto dos Coronéis (69 deles exigiam a sua saída), Getulio queria resistir, Jango amainou: “Não há problema, presidente, não estamos em condições de resistir”. Em 1964 disse a mesma coisa, embora eu tivesse escrito então, na primeira página da Tribuna, incentivando-o a resistir. Preferiu atravessar a fronteira e ficar longe por 15 anos.
O PLEBISCITO DE
6 DE JANEIRO DE 1963
Jango ficou o fim de 1961, todo 1962, marcou a volta para o presidencialismo no início de janeiro. O movimento de dinheiro para esse fato só pode ser definido numa palavra, e assim mesmo sincopada: c-o-l-o-s-s-a-l. Ou inacreditável. O principal recolhedor, abastecedor e distribuidor desse dinheiro: José Luiz Magalhães Lins, sobrinho do então governador de Minas.
Os filhos de Magalhães Pinto eram ainda adolescentes, quem dirigia tudo era o José Luiz (que eu só chamava de “Zé do Caixão”). Essa dinheirama enriqueceu de forma espantosa o próprio banqueiro, e sobrou muito para comprar a vitória do presidencialismo.
COMEÇAM AS LOUCURAS
DE JOÃO GOULART
Poucos dias antes de sair, Jânio nomeou Roberto Campos embaixador nos EUA. Jânio era Jânio, tudo era possível. A renúncia anulou tudo, o Brasil ficou sem embaixador. Mas assim que assumiu, na transição parlamentarista, Jango mandou Roberto Campos para Washington. Então ele não sabia que Roberto Campos era mais americano do que qualquer americano?
A partir de janeiro de 1963, com plenos poderes. Jango formou um bom Ministério em relação a nomes, mas com pouca representatividade política ou eleitoral. Além da nomeação de Roberto Campos, outra indicação assombrosa: a do general Amaury Kruel como ministro da Guerra. No Manifesto dos 69 coronéis que exigiam a saída de Jango do Ministério do Trabalho, o coordenador do movimento e que assinou em primeiro lugar foi o próprio Amaury Kruel.
Mais tarde foi chefe da Casa Militar do próprio Jango, promovido a general de 4 estrelas (Exército) e nomeado comandante do II Exército. Foi o mais ativo na derrubada de Jango. Disse na televisão: “Se Jango se livrar os comunistas eu o mantenho no Poder”. Kruel não tinha força para isso e Jango já estava em rota de fuga.
Jango não estava preparado para a Presidência. Devia tudo a Vargas, desde a primeira eleição, deputado estadual. Seu objetivo era unicamente pessoal, desejava o Poder, para mantê-lo o maior tempo possível, jamais teve uma ideia coletiva.
Foi duas vezes vice-presidente, de forma inconstitucional. Com Juscelino, numa época em que FHC ainda não havia comprado a própria reeleição, a segunda vez com Jânio Quadros. Não percebeu que os militares estavam atentos, não esqueceram a posse de Jango.
Esperavam apenas a oportunidade da vingança da derrota quando prepararam a renúncia de Jânio, tiveram que amargar o ostracismo. E Jango, insensato, colaborou com eles. Tomou posse em fevereiro como presidente de fato, implantou o caos, o tumulto, a indecisão, a confusão.
EM 1963, TODOS
CONSPIRAVAM
Conspirava com o que chamavam de “República Sindicalista”, pretendia mesmo era ficar no Poder. E 6 governadores importantes, todos candidatos à sucessão de 1965 (que não haveria), conspiravam igualmente. (E mais JK, fora do governo, entregara a presidência a Janio em 1961 e lançara sua candidatura para 1965).
Os governadores: Ademar de Barros (São Paulo), Magalhães Pinto (Minas Gerais), Carlos Lacerda (Guanabara), coronel Mauro Borges (Goiás), coronel Ney Braga (Paraná) e Leonel Brizola, que deixara o governo do Rio Grande do Sul e se lançara presidenciável.
JANGO, INTERVENÇÃO
NA GUANABARA
Em abril, ultrapassa seus índices de oportunismo, manda mensagem ao Congresso, determinando intervenção na Guanabara. Mal informado, quer fechar a Tribuna da Imprensa, acredita que ainda pertence a Lacerda (que há dois anos vendera a Nascimento Brito, por 12 milhões de dólares). Tem maioria no Congresso (PTB e PSD), que se recusa a aprovar a intervenção.
Sempre mal informado, quando descobre que a Tribuna da Imprensa já é deste repórter, resolve se vingar. A oportunidade chega em julho, sou preso pelo ministro da Guerra, Julgado pelo Supremo, Jango usa todos os tipos de pressão. 4 ministros contrariam seus votos anteriores, decidem contra mim. Mas sou absolvido.
Em julho, Brizola faz uma proposta a Jango, nestes termos: “Você me nomeia ministro da Fazenda, com aval do general Lott. Se eu fizer loucuras, você me demite, com a concordância do general”. Jango diz que vai decidir, conversa com quem? Roberto marinho e o embaixador do EUA, Lincoln Gordon.
Quando falou com os dois sobre nomear Brizola ministro da Fazenda, Roberto Marinho se adianta e diz: “Jango, se você nomear Brizola ministro da Fazenda, não termina o mandato”. Não nomeou e não terminou. No dia seguinte, O Globo publicou uma foto grande de Jango, com a legenda: “O presidente estadista”.
O EXÉRCITO, TOTALMENTE
DIVIDIDO
Era visível a separação militar entre golpistas e legalistas; Jango não soube coordenar esse clima. Estive preso duas vezes em quartéis do Exército. A primeira, na ID-4 em Minas. Oficiais me olhavam com ódio, outros com tom de amizade. Depois, 5 dias no Batalhão da Polícia do Exército, na Barão de Mesquita, ainda não havia o famigerado Doi-Codi, criado pelo general Orlando Geisel. Na hora do banho de sol, o de sempre. Ódio e amizade, visíveis. Oficiais importantes passavam por mim, diziam, “estamos com você”.
JANGO, O SUICIDA
POLÍTICO
Vai avançando sobre o bom-senso, age arbitrariamente, Seu chefe da Casa Militar, general Assis Brasil, lhe diz: “Presidente, 90 por cento do Exército estão com o senhor“. Não era tanto, mas pelo menos uma parte muito grande do total. Agora, a Comissão da Verdade admite que houve mais de 150 mil oficiais perseguidos por serem contra o golpe de 64.
JANGO NÃO “SENTIU”
QUE ESTAVA NO CHÃO
Acabou 63, surgia 64, qualquer um, por menos informado que fosse, sabia ou percebia que o fim estava chegando. O comício de 13 de março na Central do Brasil, incompreensível e indefinível. Conforme escrevi na época: “Um presidente só pode fazer um discurso daqueles, se olhasse para trás e visse todos os generais incentivando-o ou apoiando-o”. Não havia nada disso.
Mas insistiu, repetiu todas as loucuras, ameaças e intimidações, no dias 28 desse mesmo março, no belo edifício (tombado) do Automóvel Clube do Brasil. Jango saberia que o fim havia chegado? Não durou mais de 72 horas, João Goulart não era mais presidente.
JANGO PODIA
TER RESISTIDO
Jango não era muito bom com palavras, mas o verbo resistir era o de maior dificuldade para ele. Preferia compor, só que não havia mais tempo, por causa da sua indecisão. Parte grande do Exército, Marinha e Aeronáutica esperavam a voz de comando e de resistência, que não veio.
Jango ficou um tempo indeciso em Brasília, foi para o Rio Grande do Sul, alguns consideravam que lá teria melhores condições. Nada, de lá iria direto para o Uruguai.
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PS – Ao passar a fronteira, perguntou ironicamente ao general Assis Brasil: “Então nós tínhamos 90 por cento do Exército?”
PS2 – Não era tempo de ironia e sim de resistência. Mas a ironia dói menos, a resistência pressupõe sofrimento. O exílio é mais tranquilo.
Ps3- No Master Mil de Madri, Djokovic perdeu no primeiro jogo, Federer no segundo, Murray no terceiro. Sobrou o Nadal. Se ele não ganhar, o vencedor inédito e surpreendente. Acrescentará mil pontos ao seu ranking e 1 milhão e 500 mil dólares (3 milhões de reais) à conta bancária.
Da Tribuna da Imprensa de 11-5-2013.
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