O FARSANTE
O farsante escorraçado da Presidência acha que o bandido vai prender o xerife
Vinte
anos depois de escorraçado do cargo que desonrou, o primeiro presidente
brasileiro que escapou do impeachment pelo porão da renúncia reafirmou,
nesta segunda-feira, a disposição de engrossar o prontuário com outra
façanha sem precedentes. Primeiro chefe de governo a confiscar a
poupança dos brasileiros, o agora senador Fernando Collor, destaque do
PTB na bancada do cangaço, quer confiscar a lógica, expropriar os fatos,
transformar a CPMI do Cachoeira em órgão de repressão à imprensa
independente e, no fim do filme, tornar-se também o primeiro bandido a
prender o xerife.
Forçado a abandonar a Casa Branca em 1974, tangido pelas patifarias
reveladas pelo Caso Watergate, o presidente Richard Nixon passou os anos
seguintes murmurando, em vão, que não era um escroque. Perto do que
faria a versão alagoana, o que fizera o original americano não
garantiria a Nixon mais que a patente de trombadinha. Como isto é o
Brasil, Collor não só se negou a pedir desculpas como deu de exigir que o
país lhe peça perdão por ter expulso do Planalto um chefe de bando. Foi
o que fez no discurso de estreia que colocou de joelhos os demais
pensionistas da Casa do Espanto (leia o post reproduzido na seção Vale Reprise).
Neste outono, excitado com a instauração da Comissão Parlamentar
Mista de Inquérito destinada a apurar bandalheiras praticadas por Carlos
Cachoeira e seus asseclas, o farsante sem remédio decidiu enxergar na
CPMI as iniciais de um Comitê de Pilantras Magoados com a Imprensa. Caso
aparecesse no Capitólio em busca de vingança contra o jornal The Washington Post ou a revista Time,
Nixon seria, na mais branda das hipóteses, transferido sem escalas para
uma clínica psiquiátrica. Nestes trêfegos trópicos, um serial killer da
verdade articula manobras liberticidas com a pose de pai da pátria em
perigo ─ e com o apoio militante de inimigos do século passado.
José Dirceu, por exemplo, embarcou imediatamente no navio corsário
condenado ao naufrágio ─ ansioso por incluir entre os alvos da ofensiva a
Procuradoria Geral da República. E Lula, claro, estendeu a mão
solidária para reiterar que os dois ex-presidentes nasceram um para o
outro. Em 1993, como se ouve no áudio reprisado pela seção História em Imagens,
a metamorfose ambulante endossou, sempre em português de botequim, a
opinião nacional sobre a farsa desmontada pouco antes: “Lamentavelmente a
ganância, a vontade de roubar, a vontade de praticar corrupção, fez com
que o Collor jogasse o sonho de milhões e milhões por terra”, disse
Lula, caprichando na pose de doutor em ética. “Deve haver qualquer
sintoma de debilidade no funcionamento do cérebro do Collor”.
O parecer foi revogado por Lula, mas segue em vigor no país que
presta. Entre os brasileiros decentes, a cotação do ex-presidente é
mesma estabelecida em 1992: zero. Há quase 20 anos, Collor não vale
nada.
Da Coluna do Augusto Nunes.
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