SEGUNDA EDIÇÃO DE SÁBADO, 08 DE SETEMBRO DE 2018

NA COLUNA DO AUGUSTO NUNES
As ilusões do novo mundo
Diante do impulso de uma cultura de massas que cria e destrói incessantemente suas banalidades estéticas, é preciso resistir
Por Fernando Gabeira (publicado no Estadão)
Sábado, 08 de setembro de 2018, 07h04
A destruição do Museu Nacional aconteceu no auge da campanha política. Talvez sirva, ao menos, para que os candidatos despertem para a importância de uma política cultural e de preservação do patrimônio histórico. Talvez porque, às vezes, a crise é tão aguda e prolongada que o corpo não responde mesmo a estímulos cavalares como a perda parcial da memória do País.
Nas viagens semanais pelo País, convivo com inúmeras experiências locais de preservação da memória. Museus pequenos, às vezes improvisados, surgem em vários pontos do Brasil. A razão de sua existência é muitas vezes também econômica. São pequenas cidades com belezas naturais que querem, de certa forma, encontrar sua identidade e agregar valor às suas atrações turísticas.
Dias logo antes de o Museu Nacional desaparecer numa noite de domingo, tinha feito uma viagem entre Rio e Minas. O objetivo era percorrer nove cidades ligadas por um trem comprado em Três Rios, sem nenhuma ajuda do governo. O final da linha desse trem será Cataguases. E precisamente em Cataguases conversei com as autoridades sobre a possibilidade de um museu que pudesse abarcar a presença da cidade no movimento modernista. Poucos sabem que ali foi lançada a Revista Verde, que era defensora do modernismo nascente. E que a cidade tinha um poeta e escritor chamado Rosário Fusco, que merecia ser lembrado.
Na verdade, escritores e artistas são bons temas para pequenos museus. Na Copa do Mundo, fiquei impressionado como existem museus cultuando escritores na Rússia. Existe uma diferença de idade entre os dois países e também de importância de duas literaturas, sobretudo no século 19.
Em Volta Grande, colada a Cataguases, visitei a casa onde funcionava o estúdio de Humberto Mauro, o primeiro grande cineasta brasileiro. A casa estava fechada e meio abandonada, a piscina vazia vigiada por um imenso sapo ornamental. É evidente que com um pouco de esforço, até exibindo filmes de Humberto Mauro, aquilo poderia funcionar bem. Como funciona e é atraente o Museu Mazzaropi, em Taubaté.
Talvez esteja aí também uma diferença de peso. Museus dirigidos por fundações privadas têm mais chance no universo da decadente política brasileira.
Um dos melhores do País, entre todos, é o Instituto Ricardo Brennand, no Recife, construído por um empresário pernambucano. Quem quiser conhecer, por exemplo, os quadros do pintor holandês Frans Post, que imortalizou cenas do Brasil colonial, encontra por lá alternativas que perdem apenas para a coleção da própria Holanda.
O que quero dizer é isto: o processo de decadência que envolve a política nacional não é um dado absoluto. É possível resistir. E um dos elementos da resistência é a própria ideia de uma economia criativa, que estimule as pequenas cidades a encontrar sua vocação cultural e a cultuar sua memória. É uma forma de resistir até mesmo às dificuldades materiais do momento.
Será preciso, também, uma abertura para a parceria com a iniciativa privada. Esse bloqueio ideológico contribuiu para a destruição do Museu Nacional.
No passado, o Banco Mundial ofereceu um generoso empréstimo, exigindo que a instituição se transformasse numa fundação privada. Proposta recusada — imaginem, a memória nacional nas mãos da iniciativa privada, e não do Estado brasileiro…
Pois agora vimos como instalações elétricas precárias eram usadas até para instalar frigobar no quarto de dom Pedro; como o prédio, nas mãos do Estado, estava se tornando um perigoso pardieiro.
Não se pode apenas crucificar o Estado e estigmatizar uma classe política que está nas cordas. Há limitações mais amplas na sociedade brasileira. Nossos ricos são menos empenhados do que, por exemplo, os norte-americanos em contribuir para essas tarefas de preservação de nossa identidade cultural.
Além disso, de um modo mais amplo, vivemos no novo mundo, numa ânsia por novidades constantes e um certo desprezo pelo que passou. Tudo o que é sólido desmancha no ar, a frase de Marx, como mostra o livro de Marshall Berman, tem um grande poder de descrição do que se passa nas Américas.
Luzia, um fóssil com 12 mil anos, não resistiu à crise brasileira. Os afrescos que sobreviveram aos últimos dias de Pompeia desapareceram.
É um momento adequado para compreendermos a gravidade da nossa situação e, sem desespero, tentar uma saída, aliás nem tentar uma saída, mas apenas prosseguir na resistência cotidiana à entropia.
Independentemente até dos políticos, os dois horizontes que ainda nos restam para animar a cultura e cultuar a memória são o poder local e a possibilidade de parceria com a iniciativa privada, entendida aqui não apenas como ricos, mas também grupos de amigos das instituições.
O projeto de salvar os museus existentes ganha um pequeno fôlego com a emoção do desastre. É preciso seguir tentando abrir novos e modestos museus no interior do Brasil.
Políticos locais não são melhores do que os nacionais. Mas a necessidade de buscar fontes de renda e emprego pode empurrá-los para soluções culturais inspiradas na economia criativa.
Como o personagem de Beckett que diz não poder continuar e continua assim mesmo, o Brasil não acabou com o incêndio na Quinta da Boa Vista. Apenas ficou mais pobre.
Sem ilusões, diante do impulso de uma cultura de massas que cria e destrói incessantemente suas banalidades estéticas, é preciso resistir. Quando forem conhecidas as condições em que os cientistas e pesquisadores estão trabalhando no Brasil para manter em pé nossa busca pelo conhecimento, ficará bem claro que a resistência existe e está mais viva do que nunca, à espera de que a Nação a descubra e a adote.
Tivemos toda a semana para chorar uma perda inestimável. Vamos lembrá-la para sempre. No entanto, é hora de honrar nossa ancestral Luzia, herdando uma fração mínima de sua resiliência.

NO BLOG DO NOBLAT
Como vai Lula
Vai mal
Por Ricardo Noblat
Sábado, 08 de setembro de 2018, 08h00
Desde que foi preso, apesar de os seus visitantes dizerem o contrário para efeito de propaganda, Lula convivia com três sentimentos: a raiva, o inconformismo e a esperança na libertação rápida e na candidatura a presidente.
A esperança se foi, embora ele saiba que o ministro Dias Toffoli, tão logo assuma a presidência do Supremo Tribunal Federal, tentará dar um jeito para soltá-lo a partir do início do próximo ano. Ou antes, se for possível.
Acentuou-se a inconformidade de Lula. Ele não cansa de repetir que venceria a eleição presidencial direto no primeiro turno.
Continua com raiva, muita raiva. Nem o PT escapa dela. Quase nada escapa.

NO BLOG D DORA KRAMER
De pernas longas
Uma vez consentida, a mentira é obra difícil de demolir
Por Dora Kramer
Sexta-feira, 07 de setembro de 2018, 07h00
O problema da mentira não é tanto o mentiroso, pois a ele cabe apenas sustentar a invencionice adicionando ponto sobre ponto ao próprio conto conforme a conveniência. Mais complicada é a situação de quem trata com condescendência a mentira na ingênua fé de que a verdade é submissa ao poder soberano dos fatos. Nem sempre.
Disso vem dando notícia o PT desde que assumiu a Presidência qualificando de “herança maldita” o legado da estabilidade econômica, enquanto se preparava para aderir ao festim diabólico da roubalheira patrocinado havia décadas por seus novos companheiros de uma jornada cuja meta seria a formação de um consórcio de poder perpétuo.
De memória fraca, a maioria ignorou um fato: o ambiente estável foi uma conquista coletiva, decorrente da adesão do País a um plano que o governo sozinho não teria dado conta de executar. Inexperiente no exercício do cotejo entre palavras e atos de seus governantes, ficou indiferente às incongruências factuais, preferindo ser feita de boba pelo falatório diário conversor de mentiras pela via da repetição.
Assim, sob consentimento quase geral, operou Lula durante anos, antes e depois do poder. Daí não é de surpreender a capacidade do PT de não apenas se adaptar às vicissitudes como tirar bom proveito delas. A mentira é obra que se constrói com muita facilidade. Difícil de destruir, entre outros motivos porque tem como alicerce a desonestidade. O trapaceiro não tem compromisso com a regra; já larga no lucro quando é aceito no jogo, e na dianteira fica em relação aos demais que atuam dentro de restrições legais, morais, educacionais, sociais e/ou institucionais.
Eis a razão pela qual Lula e o PT permanecem no centro da cena política apesar de todos os pesares: falta de escrúpulos. Contra o desrespeito deslavado às leis, a afronta a decisões judiciais e a ausência total de espírito público pouco há que fazer além de aguardar que o tempo dê seu jeito. São tão emaranhados e erráticos os caminhos do fingidor que uma hora termina prisioneiro do próprio labirinto.
Lula e o PT montaram esse tipo de armadilha e seguem na direção dela. Mas como, se fazem o maior sucesso? Digo como: apostando tudo na sobrevivência da fama de uma pessoa e confessando, assim, que o partido só tem um ativo; com isso deixando de investir nas eleições estaduais e parlamentares, o que equivale ao enfraquecimento da legenda e consequente perda de importância no jogo político.
O petismo já largou a ponta da toalha, pois só quem se dá por perdido admite correr tantos riscos. Quais sejam, os de perder espaço no horário eleitoral, ficar reduzido a representação irrisória no Congresso, transformar a preferência nas pesquisas numa montanha de votos nulos por insistência em candidatura nula de origem, passar à História como campeão de derrotas na Justiça e, o risco maior de todos, ganhar a eleição sem ter como cumprir a promessa de fazer “o Brasil feliz de novo”.
Essa canoa já virou, e foi a benevolência geral para com os caprichos autorreferidos do PT o que a fez virar.
(Publicado em VEJA de 12 de setembro de 2018, edição nº 2599)

NO PUGGINA.ORG.
ABUSADORES DA PÁTRIA MÃE
Por Percival Puggina
Sexta-feira, 07.09.2018
Há cinco dias, num dos mais surpreendentes e onerosos casos de desídia de nossa História, o Museu Nacional ardeu em chamas que consumiram dezenas de milhões de documentos históricos. Seu esqueleto fumegante se transformou num símbolo. Ele ilustra o modo irresponsável como aqueles de quem trato em meu livro “A Tomada do Brasil” lidam com tudo que não diga respeito à busca do poder. Enquanto a UFRJ faz política, a exemplo de tantas universidades nacionais, o País se extravia de suas raízes e de sua memória. Uma nova História, que sequer tangencia a verdade, vai sendo construída e narrada entre rolos de fumaça, sobre os escombros do legado ancestral.
Escrevo aos bons brasileiros, aos que amam a Pátria que hoje aniversaria e que se sentem responsáveis por ela. Escrevo para muitos, então. Aproveitemos este Sete de Setembro para refletir sobre o que maus conterrâneos estão a fazer com nossa gente. Eles não podem continuar transformando o Brasil numa casa de tolerância, desavergonhada como nunca se viu igual. Nela, o banditismo das ruas é justificado em sala de aula e nos livros de Direito. Nela, as bandalheiras deslavadas e sorridentes de uma elite rastaquera e debochada, que conta dinheiro e votos como se fosse a mesma coisa, não mais escandalizam a tantos.
Já não lhes basta a própria corrupção. Dedicam-se, há bom tempo, à tarefa de corromper, o próprio povo, porque são milhões e milhões que já não se repugnam, que já não reclamam, que sequer silenciam, mas aplaudem, mas agradecem, mas reverenciam e se declaram devotos. E se dispõem a os reeleger.
Não é apenas no plano da política que a Nação vai sendo abusada e corrompida. Também nos costumes e no desprezo à ética, à verdade e aos valores perenes. Também nas novelas, na Cultura, nas Artes. Nas aspirações individuais e nas perspectivas de vida. No pior dos sentidos, aburguesaram uma nação pobre. Incitaram o conflito racial numa nação mestiça desde os primórdios. À medida que Deus vai sendo expulso, por interditos judiciais e galhofas sociais, instala-se, no Brasil, cheirando a enxofre, a soberania do outro.
Recebemos de Deus e da História um país esplêndido, no qual malfeitores instalaram seu covil. Estamos a 30 dias de uma eleição geral. Não nos conformemos apenas com o "dever cívico" do 7 de outubro. Nosso dever cívico não tem data nem prazo de validade. Empenhemo-nos na eleição dos melhores. Cocurutos se alteiam quando os montes se aplainam! Democraticamente, sob o chicote do voto, expulsemos do poder os abusadores da Pátria Mãe.

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