PRIMEIRA EDIÇÃO DE 16-4-2017 DO 'DA MÍDIA SEM MORDAÇA'

NA COLUNA DO CLÁUDIO HUMBERTO
DOMINGO, 16 DE ABRIL DE 2017
A ex-presidente Dilma sabia de todos os detalhes das negociatas com a Odebrecht, até pelo seu caráter centralizador. Marcelo Odebrecht revelou em depoimento que foi acertada uma “contabilidade criativa” para viabilizar a propina dos partidos que apoiaram sua reeleição, em 2014, mas levou até Dilma um documento de seis páginas cobrando o pagamento das “pendências” do governo com a empreiteira. Afinal, sem afanar dinheiro público não seria possível pagar as propinas.
Marcelo reclamou a Dilma que as dívidas do governo com a Odebrecht não era “forma de tratar os parceiros”.
A campanha Dilma pediu inicialmente R$57 milhões a Odebrecht, além do que havia sido doado e repassado ao marqueteiro João Santana.
Apoio do PDT, PCdoB, PRB e PROS à reeleição de Dilma custou R$ 24 milhões saídos do caixa 2, em 2014.
Mostrando sua afinidade com o “ideário” do PT, o Partido Comunista do Brasil (PCdoB) recebeu R$ 7 milhões, revelou Marcelo Odebrecht.
Em um dos mais de vinte depoimentos em sua delação premiada, o empresário Emílio Odebrecht revelou algo curioso: “Gosto de Lula, confio nele. Posso afirmar...”, disse. O patriarca da Odebrecht continua: “Desligue aí”, pediu, pretendendo detalhar seu bem-querer ao ex-presidente. Mas foi interrompido. Em outro dos seus depoimentos, Emílio se refere ao ex-presidente Lula com deferência, como “chefe”.
Um dos procuradores que tomavam o depoimento de Emilio Odebrecht pediu que deixasse para depois os “comentários aleatórios” sobre Lula.
Emílio se fazia representar em festinhas e reuniões mais íntimas da família Lula. A intenção era fazer um gesto e se “preservar”.
Nas delações, fica claro que a convivência estabeleceu laços afetivos entre Emílio e Lula. Marcelo Odebrecht se relacionava com Dilma.
Ex-presidente do Conselho de Administração do grupo, Marcelo Odebrecht está preso há quase dois anos pela operação Lava Jato, mas ainda se refere a Dilma Rousseff como a “presidenta”.
Marcelo Odebrecht contou que foi ao Palácio do Planalto (ou Alvorada, não se lembra), após a demissão de Antonio Palocci, e perguntou a Dilma com quem ele conversaria sobre “pagamentos e contribuições”: “Agora é com Guido Mantega?” Ela respondeu: “É com o Guido”.
Marcelo Odebrecht revelou que a maior parte dos pagamentos na conta “Italiano”, sob controle de Antonio Palocci, utilizava “Brani”, Branislav Kontic, assessor do ex-ministro, como um office boy de luxo.
Logo após a demissão de Antonio Palocci da Casa Civil do governo Dilma, em 2011, a conta “Italiano” administrada pelo ex-ministro destinou R$ 4 milhões ao Instituto Lula.
O TCU está “representado” na Lista de Fachin por dois ministros do TCU: o próprio presidente, Raimundo Carreiro, e Vital do Rêgo, ex-senador do PMDB-PB que recebeu R$350 mil para o caixa 2.
A aposta da Odebrecht era de que após a eleição de 2010 “não se imaginava” que Aloizio Mercadante ocuparia cargo importante no governo Dilma. Ele queria a Fazenda, ganhou Ciência e Tecnologia.
De acordo com Marcelo Odebrecht, as campanhas de Aécio Neves (PSDB-MG) e de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) já eram bancadas pela Odebrecht em 2010, quando ele aumentou valores repassados ao PT.
A amplitude das investigações da Lava Jato tem deixado em alerta até os políticos mais antigos. Há relatos de propina desde os anos 1980, quando o Brasil vivia a ditadura do general João Figueiredo.
... este domingo de Páscoa será especialmente azedo para os políticos que, além de voltar ao trabalho amanhã, estão na lista de Fachin.

NO DIÁRIO DO PODER
DOSSIÊ SERRA
ESQUEMA DA ODEBRECHT COM ITAIPAVA COMPROU DOSSIÊ DOS ‘ALOPRADOS DO PT’
PF APREENDEU DINHEIRO QUE COMPRARIA DOSSIÊ FALSO CONTRA SERRA
Publicado: sábado,15 de abril de 2017 às 18:56 - Atualizado às 23:42
Redação
ESTA FOTO, DA POLÍCIA FEDERAL, MOSTRA O DINHEIRO APREENDIDO COM OS "ALOPRADOS DO PT".

O esquema de lavagem de dinheiro criado entre a Odebrecht e a cervejaria Itaipava não bancou apenas o caixa 2 de campanhas eleitorais, mas também a compra, em 2006, de um dossiê contra o então candidato à presidência, José Serra (PSDB), episódio que ficaria famoso como o escândalo dos “aloprados do PT”.
O capítulo das falcatruas com dinheiro ilícito é narrado em detalhes pelo delator Luiz Eduardo Soares, ex-executivo da Odebrecht que atuava no departamento da propina da empreiteira.
No dia 15 de setembro de 2006, a apenas duas semanas do primeiro turno das eleições para presidência, integrantes do PT foram presos pela Polícia Federal em um hotel de São Paulo ao tentar comprar um dossiê contra o então candidato tucano ao governo de São Paulo, que concorria com Aloizio Mercadante. O então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, tentando diminuir a importância do episódio, afirmou que aquilo era obra de “um bando de aloprados”.
Foram presos em flagrante Valdebran Padilha, que tinha US$ 109,800 mil e mais R$ 758 mil em dinheiro e Gedimar Passos, com US$ 139 mil e mais de R$ 400 mil em dinheiro. Ao todo, os dois tinham R$ 1,7 milhão. Valdebran era empresário e havia sido tesoureiro do PT em Mato Grosso em 2004. Gedimar havia sido agente da PF e se apresentava como advogado do PT.
O dinheiro seria usado para comprar um dossiê envolvendo Serra, ex-ministro da Saúde, no escândalo da Máfia dos Sanguessugas. O dossiê, que se revelou ser falso, seria vendido pelos empresários Darci Vedoin e seu filho, Luiz Antônio Vedoin, donos da empresa Planam, pivô do escândalo das sanguessugas.
Um dia depois da prisão, em 16 de setembro, disse o delator Luiz Eduardo Soares, o ex-tesoureiro da campanha de Lula, José de Filippi, convocou uma reunião de emergência no comitê de campanha do PT, em São Paulo. Para não levantar suspeitas, Soares disse que tomou o cuidado de deixar seu carro no aeroporto de Congonhas e seguiu de táxi para o comitê do PT.
Quando chegou ao local, Soares diz que encontrou José de Filippi, o presidente da Itaipava, Walter Faria e Benedicto Júnior, ex-presidente da construtora Odebrecht. “Nós fomos tomados de surpresa na operação dos aloprados. BJ me ligou dizendo que tinha dado um grande problema e que precisava de minha ajuda”, disse o delator. O clima era de tensão: entre as centenas de maços de dinheiro apreendidos, um deles estava com rótulo da empresa Leyroz de Caxias, distribuidora da Itaipava que articulava a distribuição de dinheiro no esquema de propina da cervejaria.
“Como nós tínhamos essa operação que já tinha começado, de troca de reais por dólar, eles estavam com medo, porque descobriram que uma parte desse dinheiro estava com o timbre da Leyroz de Caxias. Mostrava que isso era da cervejaria Itaipava”, disse Soares.
O delator chega a dar risada, ao se lembrar do episódio. “Me dá vontade até de rir um pouco. O senhor Walter (Faria, presidente da Itaipava) falou que ele mesmo estava tirando (o rótulo) e esqueceu de um pacote, de tirar os invólucros.”
O delator lembra que as investigações avançaram, mas não chegaram à Itaipava. “Aí a coisa morreu, arrefeceu, e ninguém nunca soube de onde era o dinheiro”, disse. Luiz Eduardo Soares confirmou que o dinheiro foi repassado ao ex-tesoureiro do PT pelo próprio Walter Faria. “Eles pediram esse dinheiro e usaram esse dinheiro”, disse. Segundo o delator, José de Filippi sabia que a propina seria usada para a compra do dossiê. “Pediram a minha ajuda naquele momento de tensão. Eu sempre tive uma postura de me afastar dos problemas, apesar de eles estarem sempre me perseguindo”.
Procurado, o PT disse que não comentaria a delação. Não foi localizado nenhum representante da Itaipava desde sexta-feira para se posicionar.

DOAÇÃO ELEITORAL
MARIDO DE VANESSA GRAZZIOTIN RECOMENDOU QUE DOAÇÃO FOSSE VIA CAIXA DOIS
RECOMENDAÇÃO OCORREU EM 2012 QUANDO ELA DISPUTAVA A PREFEITURA DE MANAUS
Publicado: sábado,15 de abril de 2017 às 17:34 - Atualizado às 18:42
Redação
O ex-presidente da Odebrecht Ambiental, Fernando Luiz Reis afirmou que o marido da senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), Eron Bezerra, “recomendou” que a doação eleitoral de R$ 1,5 milhão à parlamentar ocorresse via caixa dois, em 2012. Na época, Vanessa disputava a Prefeitura de Manaus, mas acabou derrotada no segundo turno por Artur Neto (PSDB). O depoimento de Reis serviu de base para a autorização de inquérito contra a senadora e o cônjuge pelo relator da Operação Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), Edson Fachin.
De acordo com Reis, Vanessa o convidou para uma reunião na capital do Amazonas, no dia 24 de agosto daquele ano. No encontro, ela e o marido teriam pedido inicialmente uma quantia maior do que a que acabaram recebendo para a campanha. O delator afirma que não havia nenhuma contrapartida para o repasse e que era comum a empreiteira “investir” em políticos considerados promissores.
“Não tínhamos nenhum interesse específico, se não o interesse com ela. Uma pessoa capaz, moça, de um partido com o qual a Odebrecht não tinha nenhuma relação e que se mostrava um expoente”, contou. “A gente não tinha um interesse específico em Manaus, o interesse era criar uma relação com um partido que a gente não tinha, uma pessoa jovem, de futuro, isso sim era uma das coisas que a gente fazia que era apostar no crescimento, desenvolvimento de políticos jovens com discurso arrumado”, continua em outro trecho.
Em nota, a senadora afirma que as doações feitas para suas campanhas “foram oficiais, declaradas e posteriormente aprovadas pela Justiça Eleitoral”. “Diante da autorização, pelo STF, de abertura de inquérito para investigar as doações da campanha de 2012, quando fui candidata à prefeita, reafirmo que estou tranquila, pois tenho consciência que não cometi qualquer tipo de ilegalidade. Confio que isso será provado a partir das investigações”, afirma a parlamentar.(AE)

CAMPANHA DE 2014
PARA PRESSIONAR DILMA, ODEBRECHT ENVIOU DOCUMENTOS SOBRE CAIXA 2
OBJETIVO ERA DEMONSTRAR QUE A PETISTA NÃO ESTAVA BLINDADA NA CRISE DE CORRUPÇÃO
Publicado: sábado,15 de abril de 2017 às 16:15 - Atualizado às 01:14
Redação
O ex-presidente da Odebrecht, Marcelo Odebrecht, enviou à presidente Dilma Rousseff, por meio do governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel (PT), documentos que demonstravam o caixa dois em sua campanha de 2014. O objetivo seria demonstrar que a petista não estava blindada na crise de corrupção que se instalou em seu governo e pressioná-la a tomar providências quanto ao avanço da Lava Jato.
O relato foi feito pelo ex-diretor de Crédito à Exportação da Odebrecht Engenharia e Construção, João Nogueira em depoimentos à Procuradoria-Geral da República (PGR). Ele descreveu uma série de encontros com Pimentel no fim de 2014 para tratar de estratégias para evitar que as investigações levassem o governo petista e a empreiteira a uma débâcle. Na época, o petista havia acabado de se eleger governador, após um período de pouco mais de três anos como ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.
Segundo Nogueira, Marcelo Odebrecht viajou a Belo Horizonte em 17 de dezembro de 2014 a lá se encontrou com Pimentel. Naquela ocasião, teria apresentado ao petista o material sobre os repasses ilegais à chapa Dilma-Michel Temer. A questão é hoje objeto de uma ação de cassação por abuso de poder econômico e político no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
“O que o Marcelo disse foi que tinha passado uma mensagem à presidente Dilma, porque o Pimentel era muito próximo dela: a comprovação, por meio de documentos, de que contribuições com recursos não contabilizados tinham sido feitas à campanha”, afirmou o colaborador, explicando que o chefe visava a “catalisar uma atitude” do governo. “Eram tempos já desesperadores”, acrescentou.
O delator explicou que o recado foi levado a Dilma, conforme lhe teria dito o próprio Pimentel numa conversa posterior, também em BH. Dilma teria pedido a Giles Azevedo, um de seus auxiliares mais próximos, para ficar “em cima do tema contribuições”.
O delator não soube informar sobre eventuais providências do governo após o aviso de Marcelo Odebrecht. Um dos objetivos da empreiteira era que o Planalto atuasse para que uma reclamação apresentada pela Engevix contra o juiz Sérgio Moro fosse aceita pelo Supremo Tribunal Federal (STF), fazendo com que a Lava Jato fosse avocada pela Corte, o que não ocorreu.
Os depoimentos de Nogueira constam de pedido de inquérito apresentado pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, para avaliar possível tentativa de obstrução de Justiça. O relator da Lava Jato no Supremo, ministro Edson Fachin, determinou o envio do caso ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), que avaliará se há elementos para a abertura de uma investigação. Ele também autorizou a remessa de cópias dos depoimentos à Justiça Federal no Paraná.
Conforme o relato do colaborador, a Odebrecht também estava preocupada com a Operação Acrônimo, recém-desencadeada pela Polícia Federal, que poderia alcançar tanto Pimentel quanto a empreiteira. “Tenho amigos olhando, isso não vai longe”, teria dito o petista ao executivo.
No fim do ano passado, após o avanço das investigações, o governador e Marcelo Odebrecht foram denunciados por corrupção. O petista é acusado de receber propina de R$ 12 milhões para favorecer a empreiteira quando ministro. O petista nega.
Outro lado
Procurada nessa sexta-feira, 14, a assessoria de Dilma reiterou o teor de nota já divulgada, na qual alega ser mentira que tivesse conhecimento de “quaisquer situações ilegais que pudessem envolver a Odebrecht e seus dirigentes, além dos integrantes do próprio governo ou mesmo daqueles que atuaram na campanha da reeleição”.
“Após meses de insinuações, suspeitas infundadas e vazamentos seletivos de acusações feitas indevidamente por dirigentes da Odebrecht, finalmente Dilma Rousseff terá acesso a íntegra das declarações. Não conseguirão atingir a sua honra e a sua vida pública, porque tais acusações são mentirosas”, diz o comunicado.
Em nota, o advogado Eugênio Pacelli, que defende o governador de Minas, afirmou que, sobre esses fatos, “parece muito fácil demonstrar que o delator nada diz de concreto”. “Afirma ter mandado recado’ à ex-presidente, recado esse que seria a comprovação de que ele poderia se transformar em um delator, se algo não fosse feito. Pela lógica dele, nada se fez. Transformou-se em um. Melhor: no principal delator”, diz a nota.
“O governador Fernando Pimentel esclarece que sempre teve consciência da impossibilidade de qualquer interferência política na condução da Lava Jato. E foi esse o seu comportamento desde sempre. Tanto o juiz Sérgio Moro, quanto os membros do Ministério Público Federal são constitucionalmente independentes e não podem sofrer qualquer tipo de influência em seus atos. Jamais relataram algo nesse sentido em relação ao governador”, completa. O advogado também diz que é importante ressaltar que também não houve iniciativa legislativa da ex-presidente para qualquer fim contrário às investigações. “Precisamos de mais fatos e menos boatos!”, finaliza.(AE)

NO BLOG DO JOSIAS
Odebrecht anuncia o epitáfio do mito: bon vivant
Josias de Souza
Domingo, 16/04/2017 04:56
As ruas já haviam descanonizado Lula em 2015, quando um gigantesco boneco do morubixaba do PT, vestido de presidiário, passou a ornamentar os protestos contra a corrupção. Os delatores da Odebrecht providenciaram o enterro do mito ao confirmar que Lula deixou mesmo o socialismo para cair na vida. E o dono da empreiteira, Emílio Odebrecht, pronunciou algo muito parecido com um epitáfio: “Bon vivant”.
Um dos principais provedores dos confortos de Lula, Emílio evocou no seu depoimento à força-tarefa da Lava Jato uma frase que diz ter ouvido do general Golbery do Couto e Silva, criador do SNI e chefe do gabinete militar nos governos Ernesto Geisel e João Figueiredo: ''Emílio, o Lula não tem nada de esquerda. Ele é um bon vivant.''
Em 1968, já lá se vão 49 anos, Lula foi atraído para a militância trabalhista pelo irmão mais velho, José Ferreira de Melo, o Frei Chico. Nessa época, Lula tinha 25 anos. Com a velocidade de um raio, virou diretor de sindicato. Frei Chico era militante do Partido Comunista. Imaginou-se que Lula se enrolaria na mesma bandeira. Engano.
Em entrevista registrada no ótimo livro “Lula, o Filho do Brasil”, da jornalista Denise Paraná, o pajé do PT afirmaria muitos anos depois: ''A minha ligação com o Frei Chico é uma ligação biológica. Ou seja, um negócio evidentemente de irmão para irmão. Não tinha nenhuma afinidade política com Frei Chico.''
Com Emílio Odebrecht, Lula desenvolveu um relacionamento fisiológico-patrimonial, do tipo u'a mão suja outra. Coisa tão profunda que acabou virando matéria-prima para a força-tarefa da Lava Jato em Curitiba. Suprema ironia: além de forrar a conta bancária de Lula com os milhões das pseudo-palestras e de providenciar confortos como a reforma do sítio de Atibaia, a Odebrecht bancava até uma mesada de R$ 5 mil mensais para o ex-comunista Frei Chico.
Depois que Lula declarou que, “se a Odebrecht resolveu dar R$ 5 mil de mesada para Frei Chico, o problema é da Odebrecht”, ficou todo mundo desobrigado de fazer sentido no Brasil. O próprio Lula abusou do vale-tudo semântico ao desafiar qualquer empresário a dizer que ele pediu cinco centavos ou dez centavos em benefício próprio. A conta roda na casa dos milhões, não dos centavos.
Na época em que o Brasil ainda era um país lógico, ''lealdade'' e “ética” não eram sinônimos de ''submissão'' e ''conivência”. Nesse tempo, políticos sérios eram leais aos interesses da sociedade, não às conveniências negociais da Odebrecht.
No livro “A Ditadura Acabada”, quinto volume da extraordinária obra do repórter Elio Gaspari, há um relato sobre a passagem de Lula pela cadeia. Deu-se em 1980, nas pegadas de uma greve que eletrificou o ambiente no ABC paulista. Gaspari obteve a transcrição do interrogatório de Lula.
Verificou-se que o oficial que o inquiriu tinha uma enorme curiosidade. Queria porque queria saber se o preso, na época um líder sindical de mostruário, reunira-se secretamente com Golbery. Lula respondeu que jamais estivera com o general. Supondo-se que disse a verdade, o bruxo da ditadura, mesmo sem conhecê-lo pessoalmente, soou premonitório no comentário feito ao dono da Odebrecht: ''Emílio, o Lula não tem nada de esquerda, é um bon vivant.''
Nos 13 anos que o PT passou no poder, Lula fez consigo mesmo o que seus inimigos tentavam há quatro décadas, sem sucesso: desmoralizou-se. Ofereceu em holocausto, em altares como o da Odebrecht, o maior patrimônio que um político pode almejar: a presunção de superioridade moral. Foi para o beleléu aquela aura de diferença heroica que o distinguia. O mito morreu. Reluz sobre a lápide, com o patrocínio da Odebrecht, o epitáfio constrangedor: “Aqui jaz um bon vivant”.

PT e PSDB amavam Odebrecht enquanto fanáticos se odiavam em praças públicas
Josias de Souza
Sábado, 15/04/2017 18:38
PT e PSDB monopolizam as eleições presidenciais no Brasil há mais de duas décadas. Com o passar do tempo, as disputas foram adquirindo um quê de briga de pátio de colégio. Na sucessão de 2014, a coisa descambou. O tucanato dizia que o petismo roubara no Mensalão e no Petrolão. E o petismo respondia que o tucanato é que assaltara no Mensalão mineiro e no escândalo dos trens paulistas. De repente, os delatores da Odebrecht esclarecem que os dois lados têm razão. E os torcedores fanáticos, que pareciam dispostos a matar e morrer por uma honra inexistente, percebem que fizeram papel de bobos. Não sabem onde enfiar o ódio que estocaram para alimentar suas lacraias interiores.
Há dois anos e meio, quando Dilma foi reeleita, Aécio era o principal líder da oposição e Lula se jactava de ter dado à luz um poste pela segunda vez — algo nunca antes visto na história do país. Hoje, Dilma é matéria-prima para Sergio Moro, Aécio divide com o notório Jucá o título de campeão de inquéritos da lista de Fachin e Lula nunca esteve tão próximo da cadeia. Legenda de um líder só, o PT está no brejo sem cachorro. Com Alckmin e Serra no mesmo pântano, o PSDB ficou num mato com João Doria. O tucanato, incorporado ao governo de Michel Temer, virou força auxiliar de um apodrecido PMDB. O PT, devolvido à oposição, derrete como sorvete exposto ao Sol.
A lição primeira da hecatombe produzida pela colaboração da Odebrecht deveria ser a de que todas as premissas sobre as quais o eleitor brasileiro construiu as suas ilusões políticas depois da redemocratização do país precisam no mínimo pegar um pouco de ar. Para que o desastre servisse de aprendizado, seria preciso que os brasileiros se convencessem de que a industrialização do ódio pior do que uma sandice, é um erro. A maluquice se apaga com o esquecimento. O erro exige reflexão e correção.
Enquanto os fanáticos se odiavam em praça pública — ou nas redes sociais, que muitos acreditam ser a mesma coisa— petistas e tucanos amavam a Odebrecht no escurinho do departamento de propina da empreiteira. Parte da torcida ainda tenta fechar os olhos para a realidade. Mas está cada vez mais difícil. Os 78 delatores da Odebrecht azucrinam os fanáticos em toda parte. Eles estão na tevê, no rádio, na internet, no jornal, na revista…. E não adianta ignorar o noticiário. A voz de Marcelo Odebrecht pode invadir o grupo da família no aplicativo do celular, exigindo uma reação do fanático. Pode ser uma cara de nojo.
Há também a opção de continuar enxergando a democracia como o regime em que as pessoas têm ampla e irrestrita liberdade para exercitar a sua capacidade de fazer besteiras por conta própria, tratando a eleição como uma loteria sem prêmio e encarando o voto como um equívoco que pode ser renovado de quatro em quatro anos. De resto, aqueles que preferem odiar alguém a amar o país, podem odiar-se a si próprios. Como diria Nelson Rodrigues, um dia o sujeito acaba arrancando a própria carótida e chupando o próprio sangue, como um vampiro de si mesmo.

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